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REVISTAS PORNOGRÁFICAS COMO DOCUMENTOS HISTÓRICOS

REVISTAS PORNOGRÁFICAS COMO DOCUMENTOS HISTÓRICOS

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Redação josef.santos

2 minutos de leitura

Faz já alguns anos que comecei a construir um acervo de revistas pornográficas antigas, um pouco por saudosismo (desejo de reencontrar publicações que mexeram com a minha imaginação na adolescência e início da vida adulta, quando a internet não se fazia ainda tão presente), mas não dá pra negar que por tesão também. E o que parecia um hobby meio besta, gasto desnecessário de dinheiro, acabou ganhando sentidos mais profundos quando percebi que essas revistas, além de tudo o que representam para mim, são ainda documentos preciosos da história, sobretudo da LGBTQIA+. Com um componente extra: visto que o senso comum segue tratando esses documentos como material imprestável, nocivo até, não costuma haver lugar para tais obras em arquivos ditos sérios… ou seja, ou pessoas bestas como eu tentam manter um registro dessas produções ou é capaz que o lixo abocanhe essas obras todas, em especial as mais velhas.

Vários são os motivos para eu chamar tais revistas de documentos preciosos. Um deles é o que vou explorar nesse retorno às minhas colunas na Fatal Model.

Uma das obras mais curiosas que encontrei, sem sombra de dúvidas, foi a Rudolf, que costumava vir acompanhada do subtítulo “a revista do sexo anormal” (às vezes aparece “insólito” ou “bizarro”, no lugar da última palavra). Publicação de origem sueca dos anos 1980, suas páginas revelam tudo o que a época considerava absurdo em termos de sexualidade e, passados cerca de quarenta anos, é até difícil imaginar que ela era livremente vendida em bancas de jornais. Nas edições que encontrei, há zoofilia explícita, sexo na lama, chuva dourada, podolatria, pessoas com deficiência, mulheres gordas, lésbicas e travestis, tudo debaixo da mesma etiqueta.

Acervo de Revistas Rudolf de Amara
Acervo de Revistas Rudolf de Amara

Eu tinha uma vaga memória de, no comecinho dos anos 2000, nas minhas primeiras aventuras no terreno digital da pornografia, “travestis” serem colocadas nessa categoria e a Rudolf me mostrou que isso não era delírio. Os padrões de corpo, gênero e sexualidade estabelecem uma norma do que deveria ser desejado e dão a entender que tudo o que está fora dessa norma deve ser considerado abjeto, mas revistas como essa (assim como o próprio mercado do sexo) mostram que essa abjeção não impedia a existência de desejo, assim como de curiosidade por tais figuras e práticas.

Quando nos recusamos a falar sobre sexualidade de maneira direta e franca, sem tabus, não estamos fazendo com que essas fantasias fora da norma desapareçam, mas sim escondendo-as debaixo do tapete. Estamos também ensinando pessoas a sentirem vergonha, ódio do que aprenderam a desejar (já que nunca se trata de uma escolha racional e sim de algo que independe de nossa vontade) e ainda jogando nos ombros de trabalhadoras/es sexuais a responsabilidade de lidar com as demandas sexuais mal resolvidas da população.

Conseguem imaginar o que um acervo voltado para essas publicações seria capaz de revelar sobre quem somos e a sociedade em que vivemos? Preparem-se, portanto, pois putaria vai virar assunto sério aqui: vou começar a explorar algumas dessas publicações nas minhas próximas colunas.

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