>
>
Acompanhantes e o abuso psicológico: Gaslighting, o que é e como lidar.

Acompanhantes e o abuso psicológico: Gaslighting, o que é e como lidar.

Foto de Redação josef.santos

Redação josef.santos

4 minutos de leitura

Ultimamente tem se falado muito em transtornos e abuso psicológico, parece algo que “está na moda”, porém são problemas que sempre existiram, apenas ganharam nome e passaram a ser alvo de estudo e de questionamento.

Hoje venho falar com vocês sobre o Gaslighting, pra quem assim como eu não está tão familiarizado com o nome (mas somente o nome mesmo, porque quase todos, senão todos, sabem bem o que é) eis a definição: Gaslighting é uma forma de abuso psicológico na qual informações são distorcidas, seletivamente omitidas para favorecer o abusador ou simplesmente inventadas com a intenção de fazer a vítima duvidar de sua própria memória, percepção e sanidade.

A origem do nome vem de um filme americano chamado Gaslight de 1944, onde um homem tenta enlouquecer a esposa para roubar sua fortuna, e para isso começa a acender e apagar as luzes da casa e convence a mulher de que ela está imaginando tudo. Percebe o quanto você está mais familiarizado com isso do que imaginava? Dificilmente exista alguém que já não tenha passado por isso, mas já parou para pensar que nós Acompanhantes somos vítimas de gaslighting quase todos os dias? Vem que vou te explicar como.

Somos culpadas por existirmos e sofrermos abuso psicológico

Vou me ater a situações onde o homem é o abusador e a mulher a vítima, porque é a situação da qual infelizmente eu sou familiarizada e tenho propriedade para escrever. Eu como acompanhante, assim como milhares de outras colegas, leio mensagens ofensivas todos os dias, sem receber sequer um oi, um boa tarde, um mínimo de educação, e não pense que essas mensagens vêm somente pelo meu contato profissional, nas redes sociais também não tenho paz.

Nas vezes em que me deparo com essas mensagens, sempre falo que aquela não é a forma de se começar uma conversa e tampouco é educado, o que eu leio de volta? “Mas você não é acompanhante? não trabalha com sexo?” e aqui estou maquiando as palavras, porque os termos não são esses. Passam a me culpar pelo comportamento deles, como se eu não merecesse nada diferente daquilo, e pra piorar, ainda jogam um “também não precisa falar desse jeito comigo” quando tudo que fiz foi exigir o mínimo, respeito, e passam a tentar me fazer pensar que estou errada e pedindo demais.

“Desculpa, é que você é muito gostosa”

Qual a mulher que já não ouviu isso de um homem como justificativa para um comportamento infeliz que ele teve? Uma das desculpas que mais escuto depois de me “elogiarem” de forma totalmente grosseira e eu falar que não gostei, é que sou muito gostosa e ele não conseguiu se conter. Estamos tão habituadas a ouvir isso que passamos a não notar a gravidade que essa frase carrega.

Homens nos objetificam e nos tratam como meros pedaços de carne e a culpa desse comportamento é nossa, de nossos corpos, nossas roupas, nossa profissão, nossa foto de biquíni ou lingerie na internet, que é interpretada como convite à sexualização totalmente desrespeitosa e não consentida. Notem, não é porque somos trabalhadoras do sexo que tudo que gostamos ou até queremos ouvir, tenha que ser de cunho sexual, somos MULHERES, seres humanos, com sentimentos, aflições, inseguranças, como todo mundo.

O perigo de acreditarmos no abuso psicológico

Você alguma vez já deve ter passado, ou conhece alguém que passou por uma situação, seja num relacionamento, no trabalho ou na família, onde tentaram te diminuir e te fazer acreditar que você não merece respeito ou dignidade. Pois imagine que nós Acompanhantes passamos por abuso psicológico quase todos os dias, nos chamam de lixo, escória da sociedade, mulheres sem futuro, sem estudo, que não pensam nos filhos e envergonham a família, e que MERECEMOS isso tudo simplesmente por que trabalhamos com sexo, a coisa mais natural que existe.

E chega uma hora que passa a ficar difícil não acreditar nisso, ouvimos isso de pessoas que nem nos conhecem, eu mesma às vezes recebo mensagens com esse conteúdo de homens que nem interesse em agendar atendimento tem, o único objetivo é tentar me diminuir. Precisamos ter uma força absurda para não dar ouvidos ao abuso psicológico, é como segurar sozinha um escudo enquanto um exército inteiro te joga pedras.

Acompanhantes e relacionamentos abusivos

É comum quando entramos em um relacionamento, seja enquanto ainda trabalhamos como acompanhantes ou depois que decidimos mudar de profissão, que passemos por relacionamentos abusivos. Isso porque alguns parceiros passam a se sentir nossos salvadores, que nos tiraram “da vida”, e assim começa o gaslighting.

Você passa a ouvir que tem muito mais do que merece, já que “levava aquela vida de coitada”, e se você se separar ninguém mais irá te querer, e assim alguns homens mentem, manipulam, agridem física e verbalmente aquela mulher que passou a ser frágil por acreditar realmente que ser acompanhante faz dela uma ninguém. E meus caros, para sair de uma situação como essa, quando praticamente todo mundo vai concordar com este homem que te menospreza pela sua profissão, é muito difícil.

Mas porque ainda assim escolhemos essa profissão?

É verdade que muitas de nós são acompanhantes por não terem enxergado outra opção para se sustentarem, mas essa não é a única realidade. Eu e muitas outras optamos por sermos profissionais do sexo, aí você me pergunta, “mas Paula, com tudo isso que tu falou, por que tu ainda está nesse ramo?”

Porque eu, como mulher, corro o risco de passar por isso em qualquer profissão, ou na vida pessoal, e deixar esse risco determinar minhas escolhas só irá contribuir para que continuem tratando as mulheres assim. Prefiro ser acompanhante e tentar educar as pessoas quanto a nossa profissão do que desistir por conta de abusadores e preconceito. Eu mesma já passei por situações que mencionei aqui em relacionamentos, empregos “padrão”, até como estagiária, não são casos isolados da profissão de acompanhante, então ou lidamos com isso de cabeça erguida, ou deixamos que nos afete.

Nós acompanhantes que lutamos pelo respeito e dignificação da nossa profissão ainda temos poucos apoiadores em meio a tantos julgadores, quantas vezes você ouviu ou até falou “ah mas também, era p..ta” sem nem perceber a gravidade disso? Nós mulheres, inclusive, falamos isso de outras mulheres, de tanto que está enraizado na sociedade culpar a mulher por ser sexualmente livre, ou pior, achar que tudo que conquistou foi usando o corpo e o sexo. E se você que está lendo, sofre ou conhece alguém que passe por abuso psicológico ou qualquer outro tipo de abuso, denuncie no 180, Central de Atendimento à Mulher.

Filtre por título

Compartilhe este artigo:

Assine nossa newsletter
para receber mais conteúdo