Uma paixão arrebatadora por um homem alguns anos mais jovem, casado, vindo do Leste Europeu, chamado simplesmente de A. Uma mulher divorciada, mãe de dois filhos adultos, com uma carreira sólida, chamada Annie. Absolutamente entregue ao desejo, ela vive uma espécie de relação simbiótica: sua existência passa a se basear na presença do amante, os interesses dele passam a substituir os dela, os dias transcorrem, e ela só consegue se ocupar da preocupação de agradar a esse homem, de surpreendê-lo, de sorver o melhor de cada instante — justamente por saber que esse torpor tem data para acabar. Esse caráter cego e ridículo da paixão é uma experiência praticamente universal.
Pode parecer um pouco ingênuo e absolutamente repreensível viver desse jeito, mas quantos de nós já não vivemos algo parecido? Digo mais: quantos de nós não entregaríamos nossas vidinhas triviais em troca de uma paixão avassaladora?
De minha parte, confesso que ODEIO estar apaixonada. Sentir a fronteira da razão deixando de existir em detrimento da expectativa agonizante de ser correspondida é algo que me desespera. Mas confesso que a lembrança do friozinho na barriga nas vezes em que encontrava o objeto da minha paixão — que foram várias, ao longo do tempo — é uma das poucas sensações que não consigo replicar em outros contextos. Um torpor que preenche cada célula, que transborda desejo, medo, felicidade e insegurança. Um mix perfeito para enlouquecer qualquer um e, ainda assim, aspiramos que dure para sempre. Talvez a beleza esteja justamente na efemeridade desse sentimento: estudos apontam que a paixão dura, em média, seis meses, mas pode chegar a um máximo de dois anos, em caso de sorte absoluta.
Curiosamente, lendo o livro Paixão Simples, que narra a história de Annie e A. (e que mencionei no início deste texto), senti uma vontade incontrolável de me apaixonar novamente. Na verdade, acredito que eu tenha me apaixonado pela autora, que é a própria protagonista de seu romance. A coragem dessa mulher de se desnudar, de admitir a própria vulnerabilidade, de encarar o ridículo de si mesma é algo que me arrepia. Em 60 páginas, de um livrinho de 12×18 cm, a autora explodiu a minha mente.
Ainda que ela tente traduzir o indizível — já que é praticamente impossível explicar de maneira lógica o que seria a paixão —, seu talento está justamente na tentativa árdua de definir algo que não pode ser definido. Apesar disso, é impossível não nos identificarmos com as elaborações dela sobre a paixão e, por meio de uma narrativa crua e sincera, ela consegue criar uma conexão visceral com o leitor.
Para mim, esse livro é uma anatomia da alma apaixonada e um elogio ao luxo que é viver um grande amor.
Se você já viveu, deseja viver ou gostaria de relembrar esse sentimento, recomendo fortemente a leitura de Paixão Simples, de Annie Ernaux, ganhadora do Nobel de Literatura de 2022.
E você? Já se apaixonou por um casado? Deixe aqui nos comentários!
Mas independente do casado, acompanhe nossa colunista Gabi Benvenutti nas redes sociais clicando aqui. Leia também: