Estreando minha primeira coluna para Fatal Model para falar dessa data tão importante. Já se passaram mais de 10 dias do Dia Internacional das Mulheres. Talvez um pouco atrasada para discutir sobre esse dia, mas essa pauta é algo que devemos dialogar diariamente.
Fomos contagiadas com diversas postagens, campanhas de marketing, políticas públicas sendo anunciadas, mostrando a diversidade das mulheres e como, muitas delas, produzem desigualdades que impactam diretamente a vida dessas pessoas.
Contudo, essa data também aponta as invisibilidade de grupos sociais, tal como das acompanhantes, trabalhadoras sexuais, profissionais do sexo, prostitutas, camgirls, atrizes e modelos de conteúdo adulto. Volta e meia, precisamos reafirmar que essas mulheres são mulheres. Como assim, Carol, essas mulheres não são mulheres? Tenho a hipótese que a visão do senso comum que enxerga essas mulheres como exploradas e vítimas, retira a posição de sujeitas, se transformando em pessoas que precisam da tutela de terceiros. Isso é uma das consequências do estigma que envolve a profissão.
O que chamamos de trabalho sexual se alterou com o tempo e o espaço. Como, por exemplo, na passagem do século XIX/XX, médicos sanitaristas classificaram diversas profissões como prostituição. Dentre elas, floristas, modistas, costureiras, vendedoras de charutos, figurantes de teatro, atrizes, garçonetes, consideradas com degenerescentes de gênero por trabalharem fora dos seus lares. Com o aumento da urbanização dos principais centros do Brasil recém republicano, a força policial foi destinada para conter a circulação de mulheres que buscavam renda alternativa para viver. Na década de 1920, essas mulheres eram compreendidas como vadias e perigosas por colocarem em risco a moral, os bons costumes e a família.
Já na década de 1950, após alguns estudos, uma parcela de médicos, juristas, membros de pastorais da Igreja Católica começam a entender a profissão como uma consequência da pobreza e falta de insumos sociais. De vadias e perigosas, trabalhadoras passaram a ser vistas vítimas que precisariam de regeneração, uma chance para sair da sua profissão e se tornar uma mulher de bem. Essa visão se mantém atualmente, mas com diferenças dos atores sociais envolvidos na discussão, sobretudo movimentos feministas que concebem o trabalho sexual como o fruto da opressão, subordinação e exploração de mulheres.
A década de 80 houveram diversas transformações. Desde a emergência do HIV e da AIDS a formação do movimento brasileiro de prostitutas. O nascimento desse movimento foi crucial para mudar a perspectiva do trabalho sexual. Pela primeira vez, prostituição é nomeada como trabalho, fazendo a distinção entre exploração sexual, violência e tráfico de pessoas. Um conjunto de mulheres levantou suas vozes para falaram por si próprias reivindicando melhores condições de trabalho, combate à violência e ao estigma, reconhecimento profissional, políticas públicas adequadas para a categoria.
O movimento foi responsável pela inserção da categoria profissional do sexo na Classificação Brasileira de Ocupações em 2002. A sua inclusão ressignificou a noção prostituição a considerando como uma profissão, desvinculando dos crimes sexuais e passando a entendê-la como trabalho. Além de garantir direitos previdenciários, esse documento é uma importante ferramenta para combater o estigma que atinge diretamente milhares de profissionais.
Ainda hoje, temos diversos desafios. Mesmo hoje, ainda prevalece discursos distorcidos da atividade profissional, sobretudo pós a pandemia da COVID. O que sabemos é que estamos tratando de uma categoria de trabalhadores(as) diversa, com diferenças entre gênero, raça, classe, idade, corpos, regionalidade. Se somos mulheres diversas, devemos ter esse entendimento quando falamos da categoria de acompanhantes e trabalhadoras(es).
O primeiro passo é distanciar dessa figura de “vítima” e tratar essas pessoas como sujeitas que precisam de condições de trabalho dignas, segurança e respeito. O trabalho, com certeza, tem muitos desafios no seu cotidiano, mas vencer o preconceito e a tutela é primordial para combater o estigma.
Acompanhantes são mulheres que assim como qualquer outra que deve ter o direito de serem reconhecidas e garantidos. Reconhecer as mulheres acompanhantes no Dia Internacional das Mulheres é o primeiro passo. Isso significa incluí-las em campanhas publicitárias e de políticas públicas. Deixar que elas falam por si e não deixar estereótipos negativos da profissão ser a única voz nesse debate. Como Luza, uma das coordenadoras da Associação de Prostitutas da Paraíba (@aprospb) sempre afirma: mulheres são iguais em qualquer profissão.