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Frutos do Trabalho

Frutos do Trabalho

Foto de Redação josef.santos

Redação josef.santos

3 minutos de leitura

A exposição que iniciei ainda sendo acompanhante me rendeu bons frutos que colho até hoje.

Tudo começou através do blog que criei em janeiro de 2004, onde publicava textos que eram como gritos para que alguém enfim me enxergasse, mesmo eu sendo apenas mais uma acompanhante no meio da multidão. Eu queria que não vissem apenas a mim, mas que enxergassem o lado humano de todas.

A vida de uma acompanhante não é apenas fazer sexo recebendo um cachê em troca, somos muito mais do que isso, somos mulheres, apenas cobramos pelo prazer que oferecemos com nossa companhia.

Em pouco tempo, questão de dias, meu blog que era para ser apenas um diário virtual, tornou-se uma ferramenta de trabalho, marketing pessoal, onde divulgava meu trabalho. Tive a ideia de dar notas aos clientes, avaliá-los de todas as atitudes, especialmente sexuais. Homens gostam de avaliar a performance sexual das mulheres, por que não fazer o mesmo com a deles?

Sinceramente, eu não imaginava se a reação deles seria positiva ou negativa por estarem sendo avaliados, porém descobri que era isso que eu precisava para me destacar e chamar atenção. Foi o que trouxe a fama até mim. 

Em agosto de 2004, poucos meses após iniciar o blog, o jornalista Pedro Dória estava escrevendo uma matéria sobre acompanhantes que usavam a internet como ferramenta de trabalho e na pesquisa dele, encontrou meu blog. Entrou em contato comigo querendo uma entrevista e acabou se tornando o “padrinho” da Bruna Surfistinha, pois foi o primeiro jornalista que me notou.

A partir da nossa entrevista, tudo aconteceu de uma maneira muito rápida. Poucos meses depois, o dono da editora entrou em contato comigo, querendo publicar uma biografia sobre mim. Me aposentei e deixei de ser acompanhante menos de um mês antes da publicação do livro, O Doce Veneno do Escorpião, que se tornou um best-seller em poucos dias no Brasil e foi traduzido para mais de dez idiomas, incluindo em mandarim.

Fui entrevistada por pessoas que sempre admirei e que cresci assistindo na televisão: Jô Soares, Serginho Groisman, Marília Gabriela, Antônio Abujamra e Marcelo Tas são algumas das pessoas que digo com orgulho que me entrevistaram.

Também fui entrevistada pela mídia importante de outros países como o  New York Times. Tive mais de uma fase de auge. Primeiro foi com o sucesso do livro em 2005, depois com o lançamento do filme em 2011 com a Deborah Secco me interpretando. Mas após o filme, nem todos sabem que existe uma série baseada em mim: ‘Me chama de Bruna’ que a Maria Bopp me interpreta tão impecavelmente quanto a Deborah. São quatro temporadas disponíveis na Amazon Prime. 

A fama e o sucesso que a história da minha vida causou me assusta até hoje, pois jamais imaginei viver tudo isso. Acho minha trajetória tão comum, eu era apenas uma menina com 17 anos querendo caminhar com as próprias pernas e bem longe da família tradicional brasileira, escolhi a prostituição como o caminho para conquistar minha liberdade financeira. Simples assim. E da noite pro dia, tantas coisas começaram a acontecer e fugir do meu controle, mas é claro que aproveitei bem todas as oportunidades que surgiram. Quando resolvi dar a cara a tapa com o blog, eu estava preparada para receber apenas tapas, mas recebo muito carinho até hoje. 

Eu não abri caminho e portas apenas para as acompanhantes, mas para pessoas que querem ter a liberdade de ser o que bem quiserem ser, com coragem e sem se importar com os fiscais das vidas alheias.

Após a prostituição, a vida me trouxe até onde precisei chegar. Vivi um casamento durante dez anos com um ex-cliente, depois um relacionamento por três anos e meio, e por fim, o último por um pouco mais de dois anos que foi o pior de todos, mas que me permitiu viver meu sonho de ser mãe e ainda em dobro com duas filhas gêmeas. 

Minhas filhas estão com 01 ano e 08 meses e no momento certo elas saberão sobre meu passado. Não escondi da sociedade, então não tenho motivos para esconder delas que são partes de mim e as únicas pessoas a quem devo satisfação. Não tenho medo de que se sintam influenciadas por mim e que se tornem acompanhantes algum dia, meu medo é apenas sobre nossa sociedade machista, ainda cheia de preconceitos e pessoas doentes que matam por simplesmente não aceitarem as escolhas dos outros. 

Na época da prostituição, trabalhei com muitas acompanhantes que já eram mães e sempre admirei o quanto era leoas e guerreiras, posso garantir que muito melhores do que muitas mães madames. Ainda sou muito reconhecida nas ruas e em qualquer lugar que esteja, acabei me tornando uma figura marcante, é claro que tenho muitos haters e continuo sendo atacada com mensagens, mas todo o carinho que recebo recompensa a maldade.

As acompanhantes são subestimadas além de julgadas por quem não as aceitam na sociedade, é como se elas não merecessem sucesso e ter realizações pessoais. Muitas pessoas ainda me chamam de puta como se fosse uma ofensa, mal sabem que eu gosto e recebo como elogio. No meu ponto de vista, todas as acompanhantes são uma puta mulher.

Sobre a autora
Raquel Pacheco, a Bruna Surfistinha, é escritora e ex-acompanhante. Desde maio de 2023, escreve contos duas vezes por mês para o Fatal Blog.

https://fatalprod.josef.com.br/blogcolunistas/bruna-surfistinha-vida-facil-nem-pensar/
https://fatalprod.josef.com.br/blogcolunistas/quando-a-acompanhante-e-a-namorada-sao-a-mesma-pessoa/

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