Tratar do tema abuso sexual é um tanto doloroso para qualquer pessoa que já tenha passado pela infeliz experiência. Como sabemos, o abuso sexual não é algo vivenciado somente por mulheres, crianças e adolescentes. No entanto, ao tratarmos o assunto dentro da esfera dos profissionais do sexo, existe uma visão distorcida da nossa sociedade e até dos próprios acompanhantes iniciantes em pensar que certas coisas são “normais” nessa profissão.
Por isso, nesse artigo quero trazer algumas orientações sobre o assunto com base nas minhas experiências e de relato de colegas também acompanhantes, para que todos possam identificar os sinais de abuso sexual quando este ocorrer e o que fazer nesses casos.
O que Caracteriza Abuso Sexual Para Acompanhantes
De uma forma geral, abuso ou violência sexual, de acordo com o Manual para Atendimento às Vítimas de Violência, cartilha do Ministério da Saúde, é “toda relação sexual em que a pessoa é obrigada a se submeter, contra a sua vontade, por meio de força física, coerção, sedução, ameaça ou influência psicológica. Essa violência é considerada crime (…)”.
O abuso sexual é considerado crime no Brasil. É previsto no artigo 215 do Código Penal, “Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima: Pena – reclusão, de 02 a 06 anos”.
Durante o trabalho dos profissionais do sexo, o abuso ou a violência se caracteriza por todo ato que o(a) profissional não esteja de acordo e é forçado a fazê-lo. Embora não haja nada específico na lei sobre essa categoria de profissional, haja visto que também não existe uma regulamentação, o crime se aplica e deve ser investigado e punido da mesma forma.
Comportamentos como usar de força na penetração vaginal, tentar sexo anal sem permissão, forçar o sexo oral ou finalizar na boca do acompanhante sem permissão, é tudo considerado abuso sexual. O limite é até onde você está de acordo.
Outra prática muito comum por parte dos clientes é conhecida como Stealthing no meio sexual. É quando o parceiro tira o preservativo e tenta penetração desprotegida sem consentimento da acompanhante, isso também é considerado um crime. Esse ato deixa a pessoa suscetível a doenças graves sexualmente transmissíveis, como o HIV.
Casos Reais de Acompanhantes
Por diversas vezes ouvi de colegas acompanhantes histórias de abuso sexual durante o trabalho. O ato de tirar o preservativo e tentar a penetração sem proteção, conforme citei no parágrafo acima, acontece com muita frequência. Principalmente em algumas posições sexuais em que o profissional do sexo não tem a visão completa do cliente como, por exemplo, na posição de quatro, ficando vulnerável a essa atitude irresponsável.
Tal situação aconteceu com uma amiga bem próxima, e além do cliente tirar e penetrar sem o preservativo, ainda ejaculou dentro dela e simplesmente deu a desculpa que “não resistiu”.
Recentemente ouvi de uma colega que foi contratada para duas horas de atendimento, que no durante o sexo oral o seu cliente começou a forçar a sua cabeça para que o pênis fosse mais fundo na sua garganta, o que provocou dor. Quando ela reclamou com o cliente, ele lhe respondeu que “as mulheres gostavam desse tipo de sexo”.
Ela, que costuma ser muito firme e não se abalar com o que lhe acontece nesse ramo, disse que naquele dia chorou, ficou realmente abalada com a violência do ato, pegou as suas coisas e foi embora, sem continuar o atendimento por não ter sido respeitada por parte do cliente.
Outra colega, que já deixou de trabalhar como acompanhante, relatou que certa vez o cliente quis ficar, nas palavras delas, “metendo” por horas e quando ela disse que já não estava mais confortável, ele alegou que a sua mulher aguentava muito mais tempo.
Vivi na Pele
Infelizmente também tive o desprazer em vivenciar um abuso sexual no exercício da profissão de acompanhante. Certa vez, acertei com o cliente um pacote que incluía sexo anal. Tudo estava ocorrendo bem até que durante a penetração anal, ele começou a forçar as investidas de um jeito que me incomodou fisicamente, causando dor.
Deitada na cama de bruços, com ele por cima de mim, pedi que parasse um pouco porque estava me machucando. A resposta foi uma negativa, que não queria parar porque ele já estava quase no fim. Eu insisti, mas percebi que quanto mais eu mexia para sair debaixo dele, mais ele aumentava a pressão e machucava.
Lembrei-me de uma explicação que já tinha lido a respeito de pessoas que sente prazer provocando violência e percebi que não adiantaria insistir em sair dali, pois o estrago poderia ser maior.
Fechei os olhos e pensei em outras coisas para relaxar até que ele finalizasse e saísse de cima do meu corpo. Eu tinha pouco tempo de acompanhante, tive que decidir que aquela situação em particular não iria me abalar a ponto de deixar meu trabalho e assim o fiz.
Não registrei nenhum boletim de ocorrência, pois morava numa cidade pequena, onde não poderia expor que trabalhava como acompanhante, pois naquele momento era de forma discreta. Apenas deixei de atender homens que eu julgava que poderia me machucar novamente.
Como se precaver nessas situações?
O acompanhante iniciante precisa saber que o pagamento pelo atendimento sexual não dá ao cliente um ingresso de “vale-tudo”. Ele só pode fazer aquilo que ambos estiverem de acordo. Isso é muito importante.
Devido a nossa falta de amparo trabalhista, precisamos tomar todos os cuidados possíveis. Recuse atender qualquer pessoa que, já durante o agendamento, não trata o profissional com educação. Sempre digo que se a pessoa não foi educada por telefone, tem grandes chances de ela ser mal educada e até violenta pessoalmente. Nesse caso, evite.
Mantenha seu celular próximo de onde você estiver e a qualquer desconfiança do cliente, deixe aplicativos de gravação de áudio ou câmera ligada. Assim, se não houver lesão corporal para que se comprove a violência, a gravação é a sua única prova contra o sujeito.
Como Proceder se Ocorrer a Violência Sexual
Procure criar o máximo de provas ou testemunhas. Se tiver atendendo no motel ou hotel, chame um funcionário e relate a situação. O seu estado emocional abalado será confirmado por essa pessoa futuramente, se houver um processo judicial.
Não é necessário fazer um escândalo, senão o cliente ainda pode alegar ter sofrido constrangimento. Apenas chame uma pessoa e explique a situação e peça ajuda para se acalmar.
Caso precise fazer um boletim de ocorrência é importante estar atento a duas situações: expor a sua profissão a funcionários públicos e o constrangimento, caso esses te tratem com preconceito.
E um conselho final, não deixe que uma experiência ruim provocada por uma pessoa cheia de maldade controle o seu estado emocional. Lembre-se, coisas ruins nos acontece uma hora ou outra, às vezes no trabalho e às vezes na vida pessoal, a sabedoria está em não deixar que isso direcione os rumos da sua vida.
Lamente, mas supere e deixe no passado, porque o futuro não pode pagar o preço de gente que não tem o mínimo valor.
Recomendo que também confira o artigo Dicas de Segurança para Acompanhantes, onde falo mais sobre como se proteger e evitar surpresas desagradáveis na hora do atendimento.